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Motivos práticos contra a PEC 37

A PEC 37 vai atingir em cheio o que fazemos todos os dias no Ministério Público

É o seguinte: A PEC 37 quer tirar do Ministério Público o poder de investigar crimes.

Em termos jurídicos, MP não quer presidir inquérito policial (substituir o Delegado no inquérito policial).Antes de analisar especificamente o que a PEC 37 quer proibir, vamos esclarecer o que a Constituição Federal descreve.

A Constituição Federal fala que cabe a Polícia Federal (na Justiça Estadual, cabe a Policia Civil essa função) exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. Significa que cabe a Polícia Federal ser a polícia que cumprirá as determinações da Justiça Federal, nos procedimentos e processo que correm perante ela, excluindo desta função, a Polícia Civil, por exemplo. Mas, a Constituição Federal fala também que o MP pode requisitar diligências investigatórias. E fala ainda que cabe ao Ministério Público promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei.

O que significa dizer que cabe ao Ministério Público promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei?

Em outras palavras, o que significa dizer que o Ministério Público é o titular da ação penal?Isso quer dizer que o Ministério Público possui legitimidade para dizer se uma conduta praticada por uma pessoa é crime ou não nesse país. E se o Ministério Público possui esta legitimidade, deve também possuir os meios para chegar a esse fim.E esse meio é a investigação, o poder de investigar.Pois bem. Voltando a PEC 37, vamos explicar o que ela quer proibir de forma prática, com base em exemplo do dia-dia.

Na realidade do Ministério Publico, abrimos procedimento investigatório criminal por diversos motivos Exemplificando, essa abertura de procedimento é realizada diante de uma representação (“denúncia”) enviada por qualquer cidadão. Esse procedimento fica registrado no gabinete de um Procurador da República (ou de um Promotor de Justiça na Justiça Estadual), que ficará responsável por analisar e tomas as providências cabíveis.Aqui entra o primeiro problema. Ainda que o cidadão envie essa “denúncia”, o Ministério Público não poderá abrir o procedimento investigatório, qual seja, tomar qualquer providência para a resolução e investigação.

Deverá sim, enviar a “denúncia” para o Delegado de Polícia abrir o inquérito policial e tomar todas as providências.Vamos dar um exemplo para tentar esclarecer na prática.O IBAMA envia um auto de infração contendo os dados de um desmatador, a localização do desmatamento, mas falta, por exemplo, saber se o autuado se defendeu no processo administrativo (por exemplo, por faltar a assinatura do infrator no auto de infração).

Para saber disso, precisamos enviar um ofício ao IBAMA vinculado ao procedimento investigatório criminal (PIC) que está aberto em gabinete.O IBAMA recebe e devolve a cópia integral do procedimento administrativo que gerou o auto de infração. A partir daí, verificamos e constatamos que o infrator assinou o aviso de recebimento enviado pelos correios e se defendeu do auto de infração no IBAMA.

E qual o motivo desse simples ofício ser considerado um ato de investigação criminal?

Porque o ofício está registrado em um procedimento investigatório criminal aberto no Ministério Público, que por meio do ofício expedido ao IBAMA, requisita os documentos necessários para ingressar com a ação penal. Com isso, já podemos entrar com a ação penal (denuncia criminal) na Justiça.Não sei se perceberam, mas a pergunta que se faz agora é a seguinte: onde o delegado de Polícia Federal participou da investigação nesse caso?

Em nenhum momento é a resposta!E o motivo é que nesse caso, é desnecessário porque a investigação foi realizada pelo Ministério Público, de forma buscar apenas os documentos que comprovam a autoria e a materialidade (que o crime existiu) do crime ambiental, via ofício! Isso agiliza a investigação, torna mais efetiva a punição e busca evitar a prescrição, pulando partes burocráticas inúteis.Se a PEC 37 for aprovada pelo Congresso, não poderemos mais abrir o procedimento investigatório criminal e enviar para a sua instrução, um simples ofício (aquele ofício expedido dentro do PIC que requisita ao IBAMA, por exemplo, os documentos, as provas de que o cidadão é inocente ou culpado).

Não poderemos mais fazer isso, e teremos que repassar o auto de infração do IBAMA para o Delegado para que ele procure as mesmas provas e depois envie de volta as mesmas coisas para o Ministério Público, as quais este poderia diretamente procurar. Ou seja, surgirá um intermediário entre o Ministério Público e as provas que comprovarão se o crime existiu ou não.E quem perde com isso?A Sociedade e a própria Polícia porque só irá aumentar a prescrição pela demora, aumentará a burocracia e diminuirá a eficiência na investigação, já que a Polícia é muito assoberbada de relevantes trabalhos e perderá um grande aliado no auxílio da solução de crimes: o Ministério Público.

Luiz Eduardo Camargo Outeiro Hernandes

Procurador da República em Santarém/PA

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