Poder de investigação do Ministério Público e os crimes econômicos

Como é por todos reconhecido, há um cinturão de impunidade em torno do criminoso do colarinho branco, ou seja, daquela pessoa de elevado status social que pratica ilícitos no âmbito das suas atividades econômicas.

Muitas são as causas dessa histórica impunidade, figurando, dentre as principais, as dificuldades investigatórias, uma vez que este criminoso planeja suas ações com sofisticação, intentando não “deixar rastros” e agindo, quase sempre, através de uma empresa, onde há evidente dificuldade de se saber quem foi o responsável pela ordem delitiva.

Contudo, rompendo com esse estado de coisas, o Ministério Público tem se notabilizado, nos últimos tempos, por uma perseguição mais eficiente dessa categoria de delinquente. A razão de tal êxito pode ser explicada pela aproximação dos procuradores da República com os servidores dos órgãos de fiscalização e de punição administrativa dos diversos setores da economia, como a Receita Federal do Brasil, o Banco Central, a CVM, a Susep, o Ibam, etc.

Nesse contexto, ultimados os trâmites apuratórios de infrações como a sonegação fiscal ou previdenciária, fraudes no mercado financeiro ou de valores mobiliários, gestões ilícitas de títulos de capitalização, delitos ambientais, dentre outros, o órgão administrativo encaminha o procedimento ao MPF que, de posse do conjunto de informações necessárias, deflagra uma ação penal contra os seus responsáveis.

Poupa-se, dessa forma, tempo e dinheiro estatal, que seriam desperdiçados caso o Ministério Público optasse por determinar a instauração de inquérito policial, inquérito que redundaria na repetição das provas já colhidas pelo órgão administrativo. Dessa maneira, ganha toda a sociedade, já que a criminalidade econômica traz prejuízos sociais infinitamente maiores do que a criminalidade dita tradicional. Evita-se, ainda, o risco da prescrição, pois, infelizmente, os crimes econômicos no Brasil têm penas brandas se comparados à generalidade das sanções do Código Penal.

Diante disso, causa profunda preocupação a chamada PEC 37, que tramita no Congresso Nacional, pois ela visa, através de emenda constitucional, retirar do Ministério Público o poder de deflagrar, de imediato, a ação penal ou, ainda, de requisitar um ou outro documento que completaria o quadro probatório necessário à eficaz persecução daqueles tipos de crime. Numa palavra, ao impor, com exclusividade, a instauração de inquérito policial, para se repetir burocraticamente o que já havia sido produzido no âmbito do órgão administrativo, a mencionada PEC 37 presta, na verdade, um desserviço para toda a sociedade.

Desse modo, em prol dos interesses, não do Ministério Público ou da Polícia Federal mas de todos os brasileiros — pois a impunidade dos autores de crimes econômicos afronta e causa indignação às pessoas honestas e trabalhadoras — espera-se que o Congresso Nacional rejeite a citada PEC 37. É preciso caminhar para frente; aprimorar o nosso sistema de justiça penal. Seguramente, a criação de monopólios investigatórios, além de ser uma medida retrógrada, somente trará benefícios aos criminosos do colarinho branco!

 

* Artur Gueiros é procurador Regional da República e professor de direito penal da Uerj.

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